O burnout associado à urgência em debate

Há muito que a Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) alerta para o problema: há um excesso de recurso dos portugueses aos serviços de urgência. “Somos o país em que os cidadãos mais recorrem às urgências hospitalares. Cerca de sete em cada dez portugueses recorre a estes serviços, enquanto a média europeia é menos de metade deste valor. Além disso cerca de metade destes doentes poderia ter resposta fora das urgências”, confirma Luís Campos, presidente da SPMI. No III Congresso Nacional da Urgência, que se realiza nos dias 14 e 15 de outubro, no Centro de Congressos Bissaya Barreto, em Coimbra, o tema volta a estar em cima da mesa, assim como as consequências para os profissionais que trabalham num ambiente onde se a pressão já é grande, agrava-se ainda mais pelo excesso de doentes. “É óbvio que a pressão para quem trabalha no serviço de urgência é muito maior do que noutros serviços”, confirma João Porto, internista e presidente do congresso. “E a pressão é de tal forma forte que temos muitos colegas que, assim que conseguem, deixar de trabalhar naquele serviço.”

O volume de trabalho e o stress é elevado. Assim como os casos de burnout – os dados do estudo nacional da Ordem dos Médicos, ‘Burnout na Classe Médica’ revelam que 66% dos médicos inquiridos encontravam-se num nível elevado de Exaustão Emocional -, um problema que vai estar em destaque no congresso, na mesa redonda ‘O Burnout associado à Urgência’, e que dará também enfoque sobre as melhores formas de evitar esta situação. “O ritmo na urgência é muito difícil de controlar, já que o número de urgências é muito superior ao que deveria ser. No serviço onde trabalho, o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, temos em média 450 urgências por dia e chegamos às 600 no inverno. Um valor muito acima do que deveria ser. E isso determina um acréscimo de trabalho, que também atrasa tudo: situações que poderiam ser resolvidas em duas horas demoram quatro ou mais”, refere João Porto.

Luís Campos reforça a mensagem da necessidade de reduzir o recurso às urgências, através de um aumento da capacidade dos cuidados primários e da informação à população. “É preciso consciencializar os cidadãos para a necessidade de uma melhor utilização dos recursos e criar respostas para os doentes crónicos, que são complexos, descompensam facilmente, e têm sido tratados de uma forma fragmentada, reativa, episódica e através das urgências. Para estes, são necessárias novas formas de organização, programas integrados de cuidados com equipas multidisciplinares lideradas por médicos de família e internistas, que façam a ponte entre o hospital e os cuidados primários.”

Este é, de resto, um dos temas que Luís Campos vai abordar no congresso, na conferência de encerramento ‘Uma visão sobre os serviços de urgência em Portugal’, em que chamará a atenção para uma “abordagem sistémica do problema das urgências”.

Realizado pelo terceiro ano consecutivo, o Congresso Nacional da Urgência é dirigido aos internistas, internos de Medicina Interna e não só. “Quisemos alargar a outras especialidades”, refere João Porto, salientando uma aposta que parece ter sido ganha. “Organizamos sete cursos pré-congresso, já que o tema principal é a formação e competência em urgência, e estão todos cheios. E se, no ano passado, já tivemos mais de 200 pessoas a assistir, este ano acreditamos que vamos ultrapassar as 300.”


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